No livro Manuscritos Econômico- Filosóficos, mais
precisamente na parte do livro sobre “O trabalho estranhado e a propriedade
privada”, Karl Marx desenvolve a ideia de trabalho alienado ou estranhado.
O autor alemão começa dizendo que o trabalho é uma
atividade vital, entretanto o advento da sociedade da mercadoria e do capital
traz uma mutação profunda no conceito de trabalho, que deixa de ser entendido
como uma atividade humana, socialmente vital e passa a ser uma forma de
produzir mercadoria para outrem, visando suprir necessidades e não mais
carências.
O trabalho, portanto, deixa ser visto como uma
atividade vital e se torna uma mercadoria e, neste processo, “o trabalhador se
torna quanto mais pobre, quanto mais riqueza produz” (Marx, p.80), pois não tem
acesso aos bens que produziu.
Neste contexto, a partir da ótica do trabalhador, o
produto do seu trabalho se lhe defronta como um ser estranho. A efetivação do
trabalho, conduz, assim, a “desefetivação” do sujeito, que perde a noção da
própria subjetividade no processo de objetivação do trabalho. É importante
lembrar que segundo a teoria de Marx, para entender o processo produtivo é
necessário ter em mente a relação dialética entre objetividade e subjetividade,
ou seja, não se compreende plenamente as relações de trabalho sem captar a
subjetividade nas práticas sociais, tema abordado nas Teses sobre Feuerbach (1845).
Ao se ver apartado da mercadoria que produz, o
trabalhador a percebe como algo externo e independente dele, portanto perde-se
a noção do valor social do trabalho, que passa a ser visto apenas pela ótica do
salário. Por outro lado, o salário não permite ao trabalhador consumir aquilo
que produziu, deste modo, a riqueza criada por muitos é apropriada por poucos,
empobrecendo aqueles muitos que a produziram, sendo esta a dialética da riqueza
e da pobreza (Marx, p. 82).
Para melhor entender o significado e implicações do
trabalho alienado ou estranhado, é preciso ter em mente os quatro momentos
constitutivos deste conceito: o primeiro momento, refere-se ao fato do
trabalhador não possuir controle sobre aquilo que produz, não se reconhecendo
no objeto produzido, ponto tratado nos parágrafos acima. Além do trabalhador
não se reconhecer no produto, ele também não se reconhece na atividade
produtiva, perdendo, assim, a noção da subjetividade presente no processo
produtivo, sendo este o segundo momento constitutivo do trabalho alienado
(Marx, p.82).
Como o trabalhador se distancia do objeto que produz,
assim como não se reconhece no processo produtivo que ele próprio realiza, o
trabalho passa a ser uma forma de negar o próprio indivíduo, sendo visto não
mais a partir do campo das carências, mas sim das necessidades. Em outras
palavras, o trabalho não visa à efetivação do indivíduo, entendido na relação com
o social, transformando-se apenas numa forma de se alimentar e suprir as
necessidades de seus familiares. O trabalho passa a ser, então, um fator
limitador do próprio desenvolvimento humano, entendido como efetividade, como realização
de suas potências. Sendo este, portanto, o terceiro momento de constituição do
trabalho alienado ou estranhado.
O trabalho, ao ser entendido apenas na forma de suprir
necessidades, faz do ser genérico do homem um ser estranho a ele. Dito de outro
modo, o indivíduo perde a noção de pertencimento ao todo social, acarretando na
percepção do outro como sendo um concorrente e não mais como ente fundamental
para a própria realização do indivíduo, impossibilitando, assim, a consciência
de classe (Marx, p.85-6), ponto que caracteriza o quarto momento constitutivo
no trabalho alienado. É importante lembrar que a realização ou a felicidade do
indivíduo esta intrinsicamente relacionada à realização e à felicidade
coletiva, pois para Marx é impossível entender o ser desvencilhado do seu
contexto histórico-social. O trabalho alienado, portanto, encobre a relação
dialética entre objetividade e subjetividade.
Em suma, a exterioridade do trabalho não aprece para o
trabalhador como resultado do trabalho, mas como algo que pertence a outro. Do
mesmo modo como na religião a auto atividade da fantasia humana atua
independente do indivíduo e acima dele, assim a atividade do trabalhador não se
apresenta como auto atividade (Marx, p.83). O trabalho alienado traz em si,
portanto, uma liberdade aparente, pois se apresenta como limitador da própria
realização humana.
MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. Trad. Jesus Raniere. São
Paulo: Boitempo, 2004.
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